Total de visualizações de página

domingo, 24 de abril de 2011

O Show

Alguns dias se passaram, sem que Marianna tivesse notícias de Dinho. Ela bem que poderia ligar, era só pedir ao Lau o número do telefone. Mas a correria do dia-a-dia e os afazeres de mãe e dona de casa, impediram que ela ligasse. 

Num domingo convidei Marianna para almoçar conosco.

- Nossa Bia, quanta coincidência! Pensa bem: Eu já estive na casa da sua mãe.

- E o mais engraçado, era que eu e o Lau estávamos nessa festa onde os meus irmãos tocaram. O Dinho filmou tudo, no dia em que você for na casa da Mamãe, peço para ele te mostrar.

- Eu nem devo ter aparecido direito. A festa estava lotada. Depois aquele sufoco para ir embora, não tinha ônibus. Tivemos que andar a pé. Uma canseira só.

Nesse instante o telefone tocou. Lau atendeu.

- Alô. Oi, tudo bem. Adivinha quem está almoçando aqui em casa? A própria. 'Peraí' que eu vou passar para ela. É o Dinho Marianna, ele quer falar com você.

Marianna pegou o telefone.

- Estou esperando você me ligar, seu enrolado.

- Uai, mas eu não estou ligando agora?

- É. Tá certo. Um a zero para você.

- E o Show, você está afim de ir? É no próximo fim de semana.

- Você nem me falou o nome da banda.

- Zumbis do espaço.


- Nunca ouvi falar. 

- Também pudera é uma banda punk do interior de São Paulo. Do cenário indie, eles tocam em locais pequenos. Mas eles têm muitos fãs.

- Este fim de semana o Bruce está comigo. No outro é dia do pai dele vir buscá-lo, se ele não falhar.

- Então sábado eu passo na sua casa e te pego às sete, tudo bem?

- Combinado.

Marianna esperou ansiosa a semana passar. Aliás, ansiosa é o sobrenome de Marianna. Está para nascer alguém mais ansiosa do que ela. É estranho, quando queremos que uma determinada data chegue logo, parece que o tempo se arrasta.

A ansiedade de Marianna, estava mais ligada ao fato de que há muito tempo ela não ia em um Show. E punk não era muito seu estilo. Punk mesmo que Marianna gostava era Garotos Podres. Mas valia a pena conhecer um lugar novo, gente nova. 


O sábado enfim chegou. Dinho pontualmente parou o carro na porta da casa de Marianna. A casa dela ficava acima do nível da rua. Na entrada havia uma escada grande. Marianna saiu, trancou a porta e desceu as escadas. Ela estava linda: Vestia uma blusa preta, fechada com ilhoses e argolas, uma calça jeans justíssima e nos pés botas de cano curto completavam o look. Nem parecia que já era mãe, tão perfeito era seu corpo.

No caminho Dinho explicou:

- Vamos deixar o carro na minha casa e vamos de ônibus.

- Por mim, tudo bem. Ando de ônibus a semana toda mesmo. Respondeu Marianna sorrindo.

- É porque vamos com uma turma. Tem uns oito amigos meus, vizinhos lá do bairro indo também. E no carro não cabe todo mundo.

- Onde será o show?

- Matriz. Conhece?

- Só de nome. Nunca estive lá.


Chegando em casa. Dinho guardou o carro e foram pegar o ônibus. A galera já estava toda esperando.  Um dos amigos de Dinho era alto e usava um chapéu parecido com um Cowboy.

- Engraçado esse chapéu, pensei que íamos em um Show punk e não sertanejo.

A turma toda caiu na gargalhada.

- Uai eu não entendi! Do que é que vocês estão rindo? Perguntou Marianna.

- Aposto que você nunca ouviu Zumbis do Espaço. Falou uma das amigas de Dinho.

- Calma Marianna que você vai saber.

- Nossa quanto suspense. 

Antes de entrarem no local onde a banda tocaria, Dinho encontrou mais duas amigas, que trabalhavam no sábado e foram direto. Os jovens se sentaram na calçada e a garrafa de vinho passava de mão em mão.

- Estranho. Parece que estou na Feirinha. Há quanto tempo não tomo vinho direto na garrafa  e me sento na calçada assim.

- Aqueles tempos eram bons.

- Ei galera, vamos entrar que o Show já vai começar.

A casa era pequena. Dois ambientes. Pessoas com um visual exótico andavam para lá e para cá. A fumaça do cigarro, misturava-se com a fumaça artificial.

Quando os Zumbis do Espaço pisaram no palco, a galera vibrou.  O vocalista da banda Tor Tauil usava um chapéu igual ao do amigo de Dinho. Na verdade o amigo de Dinho é que imitava o vocalista dos Zumbis do Espaço.


O palco era baixo, Marianna e Dinho ficaram muito próximos da banda. E se divertiram muito. No meio do Show, Marianna foi comprar uma cerveja e Dinho foi junto.

- Ei Marianna, eu queria te dar algo.

O som estava alto demais.

- O que você disse? Eu não consigo te ouvir.

- Eu disse isso:

E Dinho, beijou Marianna, no meio de toda aquela gente, no meio do Show. Que noite! Que Show!

domingo, 17 de abril de 2011

Mundo pequeno

Assim que a porta do carro se abriu, um rapaz moreno desceu, seus cabelos eram longos, castanhos, encaracolados e batiam no meio das costas. O cabelo dele estava muito maior, do que a última vez que Marianna o viu. Ele usava um uniforme cinza e calçava uma botina de segurança.

- Quer dizer que você é a tão famosa amiga, que o Lau quer que eu conheça? Como vai Sereia, quanto tempo! Falou Dinho.

- Já faz muito tempo, que não ouço ninguém me chamar assim. Respondeu Marianna.

- Eu só estou te chamando pelo seu apelido, por um simples detalhe: eu não sei o seu nome de verdade. Na Feirinha, todos te chamavam de Sereia.

- Meu nome é Marianna. E você é o Dinho, não é mesmo?

- Na verdade meu nome é Eder, mas todos me chamam de Dinho.

- Alguém poderia me explicar o que está acontecendo? Perguntou Lau.

Marianna e Dinho estavam tão surpresos, com as coincidências que a vida às vezes prega, que se esqueceram da presença de Lau. Por um instante que pareceu uma eternidade, Marianna quebrou o silêncio:

- Já faz muito tempo, o ano era 1997, eu tinha uns dezoito anos e namorava um cara chamado Fernando. Um dia, o Dinho chamou a gente para ir na casa dele, lá no bairro DB. Era seu aniversário, você se lembra Dinho?

- Como eu poderia me esquecer...Mas não tem tanto tempo assim, afinal estamos em 2002.

- Assim que nós chegamos, a banda do Dinho estava tocando uma música do Metallica.

- Sem querer interromper o papo de vocês: Será que seria pedir muito se continuássemos essa conversa dentro do carro. Afinal de contas estamos atrasados. Não é mesmo Marianna?

- Então vamos.

Os três entraram no carro. Dinho e Lau foram na frente e Marianna sentou-se no banco de trás, estrategicamente ela ficou no meio certinho, de forma que Dinho pudesse admirar seus olhos verdes.

Apesar do carro ser 1.4, Dinho dirigia bem devagar, ele ligou o rádio e a música que estava tocando era "The Price" do Twisted Sister.


- Quer dizer então que você é vizinha do Lau e da Bia, minha irmã?

- Somos quase vizinhos. Até agora eu estou 'de cara', com tamanha coincidência. Como esse mundo é pequeno.

- Além de pequeno, ele gira. Respondeu Dinho sorrindo.

- E você ainda toca na banda com seus irmãos?

- A banda acabou. Em parte por causa dos ciúmes das minhas cunhadas, que não suportavam a tietagem que acontecia em todos os lugares que a gente tocava. Mas nós ainda temos nosso estúdio montado lá em casa, com todos os instrumentos. E você Marianna, como foi morar tão longe?


- Eu me casei e o pai do meu filho queria que a gente morasse em uma casa com quintal e tudo. Hoje estou pagando o preço por isso.

- E você continua casada?

- Não, eu me separei e tenho um filho que está com um ano e cinco meses. E você se casou?

- Eu me casei.

- Engraçado, pensei ouvir o Lau dizendo que você era o único cunhado solteiro que ele tinha.

- Eu me casei com a empresa que eu trabalho. Trabalho 12, 13 e até 14 horas por dia. Trabalho sábados, domingos e nunca tiro férias.

- Nossa que horror. Mas o que você faz?

- Eu não concluí o segundo grau. Fiz um curso de ferramenteiro, no SENAI.


- Agora que vocês já colocaram o papo em dia, que tal se você convidasse a Marianna para sair  Dinho? Falou Lau.

- Lau, pára! Falou Marianna em um tom de censura.

- Gostei da ideia do Lau. Tem um show de uma banda punk de São Paulo que vai acontecer em breve, só não me lembro o dia. O que você acha Sereia?

- Eu só posso sair de 15 em 15 dias, quando o pai do Bruce vêm buscá-lo. Se as datas coincidirem...

- Então está combinado.

- Só tem um porém...

- O quê?

- Não me chame mais de Sereia. Esse apelido, pertence a outra pessoa. Foi há tanto tempo, que parece ter sido em outra vida.

- Ok! Ma-ri-anna. Falou pausadamente Dinho, sílaba por sílaba.

Dinho parou o carro, próximo a entrada de embarque do metrô. Marianna e Lau estavam muito atrasados. Marianna detestava chegar atrasada no trabalho, mas naquele momento até o adiantado da hora, não lhe chateou em nada.

- Você pode me passar seu número de telefone, para eu te ligar? Pediu Dinho.

Marianna abriu a bolsa e tirou um cartão com seu nome e o telefone da empresa.

- Nossa, que cartão legal! Pode deixar que eu te ligo.

- Eu vou esperar.

domingo, 10 de abril de 2011

Coincidências

O que era para ser provisório, foi se alongando cada dia mais. Eu estava tomando conta de Bruce o filho de Marianna, há mais de seis meses. No início, ela levava ele para minha casa às 05:20 da manhã, para depois pegar o ônibus de 05:35. Mas na medida que o bebê crescia, obviamente ele ia ficando cada dia mais e mais pesado. Às vezes estava chovendo uma garoa fina, outras um "toró" danado. Lau compadeceu-se de Marianna e resolveu buscar Bruce na metade do caminho, depois os dois juntos iam pegar o ônibus que os levava até o metrô.


As coincidências que nos ligavam a Marianna eram muitas. A mãe de Lau morava em um bairro vizinho da mãe de Marianna. Lau e Marianna estudaram na mesma escola (em anos diferentes). Os dois também tinham a mesma profissão. Mas a maior coincidências de todas, ainda estava por vir. 

Marianna morava sozinha com o filho e frequentemente, havia algo para ser feito na casa. Uma torneira para trocar a bucha, o mato que crescia no lote sem parar, um portão que não abria, uma lata de azeitona para ser aberta (Marianna amava azeitonas, devorava um vidro sozinha numa sentada só).

Marianna e Lau estavam indo para o trabalho e o ônibus como sempre estava lotado.

- Eu detesto andar de ônibus, sempre cheio, esse povo pisando no meu pé, tem sempre um engraçadinho "relando" em mim. 

- Fica calma Marianna. Hoje ainda é segunda-feira. 

- "Quando eu tiver dinheiro, quando eu tiver dinheiro, eu prometo a mim mesmo que eu só vou andar de taxi". Cantarolou Marianna.

- Que raio de música é essa?

- Ultraje a Rigor, você nunca ouviu?



- Eu conheço Ultraje, mas nunca ouvi essa música. Você tem sempre uma trilha sonora prá tudo.

- Quase sempre, Lau. Quase sempre...

- Sabe Marianna, você precisa arrumar um namorado. 

- Não me faça rir. Que cara, vai querer namorar uma mulher que já foi casada e ainda por cima tem um filho?

- Mas você ainda é nova e bonita. Que cara não ia querer uma gata como você de olhos verdes?

- Isso é uma grande ironia do destino. Um dia eu estava na casa do meu amigo Beto Preto, quando a ex dele chegou aprontando o maior barraco, falando que eu estava interessada nele...

- E aí?

- Aí que eu pensei que com tanto rapaz solteiro no mundo, porque eu ia me interessar por um cara com uma ex e um filho, não que ele fosse feio e coisa e tal. 

- Eu vou te apresentar meu cunhado, irmão da Bia, Marianna. Ele gosta de rock assim como você. Acho que vocês dois dariam um belo casal.

- Do jeito que você fala até parece que eu estou precisando desesperadamente de um homem.

- Só que eu não posso sair da minha casa, toda vez que você quiser comer azeitona.

- Tudo bem, Lau eu não te chamo mais para me ajudar.

Nesse momento o ônibus parou.

- O que aconteceu aí seu "Motô"? Gritou um passageiro enfurecido.

- O ônibus quebrou pessoal, vocês vão ter que pegar outro. Respondeu o motorista.

Um a um, os passageiros foram descendo do ônibus.

- Um ótimo jeito para começar a semana. Era só o que faltava, eu vou chegar atrasada lá no serviço. Falou Marianna, começando a ficar zangada.

- Meu cunhado esta semana, está trabalhando de manhã. Eu vou ligar para ele e pedir para ele buscar a gente.

- Isso é que é vontade de me "desencalhar". Deixa isso prá lá, daqui a pouco passa outro ônibus.

Mas Lau foi até o orelhão que havia na rua e ligou para meu irmão.

- Isso mesmo, o ônibus quebrou, aqui perto da Lagoa. Em quanto tempo você chega aqui? A gente te espera. Eu estou com uma amiga minha que quero que você conheça, até mais tchau!

Outros ônibus, tão lotados quanto o que quebrou, vieram. Os demais passageiros embarcaram, apenas Marianna e Lau ficaram. 

- Nossa seu cunhado está demorando muito, em que bairro ele mora?

- Ele mora no DB.

- Eu já fui nesse bairro. Já faz muito tempo, em uma festa. Eu namorava com um cara chamado Fernando. Nós mofamos no ponto, depois da festa tivemos que andar demais.

Nesse momento, um carro com os vidros escuros chega e retorna um pouco mais adiante, de onde Marianna e Lau estavam. 

- É ele.

- Até que enfim. 

Quando o motorista desceu do carro, Marianna não acreditou. Seus olhos só podiam estar lhe pregando uma peça. Mas era ele. O queixo dela caiu.


- Eu não acredito! Não pode ser você! É muita coincidência...

sábado, 2 de abril de 2011

Meu encontro com Marianna

Patrícia a mais nova amiga paulista de Marianna ficou com Elias, o Hippie da ONG. Valéria mais quietinha não ficou com ninguém, mas nem por isso deixou de se divertir, com toda música, choconhaque e pinga da bruxa. 

Mas como “alegria de pobre dura pouco”. As férias de Marianna chegaram ao fim. Ela Patrícia e Valéria foram embora juntas. Pegaram um ônibus até Três Corações e de lá cada uma partiria para um lado. Dentro do ônibus cantavam "Teatro dos Vampiros".


- Essa rodoviária é muito pequena. Só tem cinco plataformas. A de BH vai até a letra H. Falou Marianna.

- Só? A de Sampa tem mais de 100 plataformas de embarque. Isso é, apenas uma das rodoviárias. Disse Valéria.

- Mas São Paulo é a principal cidade do país, de lá partem pessoas para todos os lugares. É lá onde acontecem também os melhores Shows e apresentações de Teatro. Aliás, o eixo São Paulo – Rio é onde o Brasil acontece. Fico pensando nos outros estados do Brasil, lá para o lado do Nordeste, deve ter muita coisa boa acontecendo por lá, mas a mídia não divulga, só quando acontece alguma tragédia. Respondeu Marianna.

- Mari, vou sentir muita falta de você. Você é muito legal. Estava escrito que a gente ia se conhecer e eu tenho certeza que um dia vamos nos encontrar. Afirmou Patrícia.

- Nada é por acaso. Também vou sentir muita falta de vocês. Mas a gente pode se comunicar através de e-mail. Falou Marianna.



- E o César? Perguntaram em coro Valéria e Patrícia ao mesmo tempo.

- O que é que tem ele? Falou Marianna.

- Você vai mandar e-mail para ele também? Perguntou Valéria.

- Vou. Mas sem compromisso algum. Relacionamentos a distância não são fáceis de administrar. Ponderou Marianna.

- Eu vou voltar para ver o Elias, peguei até o número dele. Eu senti com ele assim, algo que não consigo explicar. Tenho esperança que um dia ficaremos juntos. Falou Patrícia.

- Vocês formam um lindo casal. Disse Valéria.

- Eu tenho certeza que esse namoro vai render e muito...Profetizou Marianna.

De fato Marianna estava certa. Patrícia voltou lá várias vezes, até o casal decidir a hora de morarem juntos. Hoje eles vivem São Thomé das Letras vendendo seus artesanatos, tocando a ONG “Brilho de Luz” e tem até uma filha.


 Na viagem de volta, Marianna estava ansiosa para ver novamente seu filho Bruce. Foi com muita alegria que o reencontrou e o abraçou. A cada dia que passava, ele estava mais lindo. Tinha os olhos verdes da mãe e os cabelos lisos do pai.
Passou o resto das férias em casa e novamente chegou o dia de voltar para o trabalho. Sua rotina continuou a mesma. Aliás, não havia rotina. Cada dia em seu emprego era único. Seu trabalho consistia em visitar diversos clientes, em especial Hospitais, quer seja com o carro da empresa, quer seja de ônibus. Havia poucos carros, para muitas visitas a serem feitas. Em geral um motorista a levava nos lugares mais distantes. Marianna não era habilitada e não se preocupava em aprender a dirigir. No entanto começou a ouvir rumores, de que a direção da empresa pensava em substituir a frota terceirizada por veículos próprios que seriam dirigidos pelos próprios empregados responsáveis pelas visitas aos clientes.

As mesmas visitas que eram feitas na capital, também tinham que ser feitas no interior do estado. Marianna teve a oportunidade de conhecer diversas cidades: Patos de Minas, Juiz de Fora, Barbacena, Ubá, Montes Claros, Jaíba. Marianna conheceu pessoas que tinham um passado muito pior do que o dela. Pessoas que haviam sido trancafiadas em Hospitais nos anos 60, 70, 80 não por serem doentes mas, por serem diferentes do que a Sociedade pré-julgava e não entendia: Epiléticos, mães solteiras, homossexuais. Se a pessoa não era louca, acabava ficando. 


Quando viajava, ficava a semana inteira fora de casa, voltando apenas na sexta-feira à noite. Quando terminava seu trabalho, ia até a Praça central das cidades, sentava-se num bar e pedia um refrigerante (era muito deprimente tomar uma cerveja sozinha). Via as mães com os filhos uniformizados, tomando um sorvete ou brincando nas praças e sentia uma certa inveja por não poder aproveitar seu filho, como as mães que não trabalhavam. Ou até mesmo, como as mães que trabalhavam quatro ou seis horas por dia. Mas Marianna precisava trabalhar, afinal ela trabalhava desde muito cedo e não imaginava sua vida sem o trabalho.

Uma vez por mês, havia um encontro de vários técnicos de diversos hospitais e Marianna sempre estava lá. Num desses encontros conheceu Lau:

- Onde você mora Marianna?

- Eu moro na cidade  "X".

- Que engraçado eu também moro lá, moro no Bairro "S".

- Mas esse é o meu bairro!

- Que coincidência. Só falta você falar o nome da rua.

- Não acredito em coincidências, tudo tem um "Porquê". Moro na Rua "H", no último quarteirão.

- Somos quase vizinhos então, porque eu moro uma rua abaixo, na rua "A", passa lá uma hora para tomar um café, assim você conhece minha esposa Beatriz e minha filha Carolina.

A moça que tomava conta do filho de Marianna teve que mudar de repente. Da noite para o dia, não havia nenhuma pessoa de confiança para olhar seu bebê. Foi então que eu conheci Marianna. Ela bateu na minha porta em um domingo à noite, estava chovendo, ela carregava o pequeno Bruce no colo, que tinha apenas onze meses. Ela bateu no meu portão procurando pelo meu marido.


- Ô de casa!

Eu surgi no portão.

- Quem é você.

- Boa noite. Eu sou Marianna. Eu poderia fala com o Lau?

- Boa noite, me chamo Beatriz. Entra, tá chovendo muito aí fora, o Lau está no banheiro.

Marianna usava um vestido preto estampado com flores brancas, o cabelo preto anelado estava solto recém lavado com cheirinho de xampu. Ela era muito bonita, magra, olhos verdes. Confesso que senti um pouco de ciúmes com aquela menina linda parada no meio da minha sala, carregando um bebê no colo. Bruce dormia um sono inocente no colo da mãe, alheio a tudo.

- Sente-se por favor. Pedi.

Nesse momento Lau saiu do banheiro.

- Oi Marianna, que surpresa, o que aconteceu, você está pálida.

- Acontece que a moça que olhava o Bruce, se mudou, sem me avisar, eu não tenho com quem deixar meu filho. Eu vim aqui, para pedir que a sua esposa olhasse ele para mim. Pelo menos provisoriamente.

- Mas você nem me conhece...

- Não te conheço, mas conheço o Lau, sei que ele é do bem. Então você também deve ser. Eu tenho que trabalhar e não conheço ninguém com quem poderia deixá-lo. Caso contrário terei que levá-lo para casa da minha mãe.

Havia desespero na voz de Marianna, quando citou a mãe. Eu também sou mãe, por isso pensei e falei:

- Eu fico com ele para você, pelo menos provisoriamente.

- Ai Bia, posso te chamar assim.

- Pode. Todos me chamam assim mesmo.

- Muito obrigada. Jesus te abençoe. Respondeu Marianna com os olhos marejados em lágrimas. 

- Não precisa chorar. "No final tudo dá certo".

- Eu estou chorando de alegria, sou muito emotiva e choro à toa.  Aliás, se eu te contar minha vida você chora.

- Adoro ouvir histórias...